sábado, 19 de junho de 2021

ONDE A TERRA ACABA E O MAR COMEÇA

Noite cerrada. Huis clos. Casa rústica numa pequena península outrora ilha. Estava Johnny Fire com um grupo de amigos a passar o fim-de-semana (devia ser fim-de-semana ou, pelo menos, o espírito era esse). O místico lugar encontrava-se nessa madrugada debaixo de uma tempestade brutal: chuva torrencial, vento violento e marés vivas a fustigarem as ribas. Apesar de tudo, refugiados no simples e pitoresco interior, que teria sido em tempos uma modesta cabana de pescadores, os rapazes jogavam xadrez (o jogo preferido de Johnny) ou king, enquanto as raparigas tagarelavam, de forma exagerada, talvez para exorcisarem  o permanente sobressalto causado pelos flashs dos relâmpagos e pelo ribombar dos trovões.
Subitamente, ouvem-se três pancadas fortes na grossa porta de madeira. O silêncio foi glaciar. Até Morrissey (fase Smiths) se calou, na aparelhagem portátil. Refeitos do susto, ganhando coragem em conjunto, decidiram abrir. Depararam-se com um bando de criaturas ensopadas em água, despenteadas pelo vendaval, sujas de areia, que pediam ajuda. Logo Johnny e os companheiros perceberam que os outros não procuravam refúgio na exígua casa mas sim que fossem ajudá-los a desatolar um jeep ali perto. Assim fizeram. A operação foi concluída com sucesso. Depois disso, nunca mais se viram. Mas havia qualquer coisa de estranhamente peculiar e ao mesmo tempo familiar naquele outro grupo. Volta e meia aqueles rostos ainda aparecem nos sonhos de Johnny.